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Traumatismos em Geral

Estudo etiopatológico dos traumas mecânicos

 

Trabalho realizado por:

LEVÃO BOGOSSIAN

Professor adjunto do Departamento de Cirurgia  da Faculdade de Medicina da UFRJ, Docente da Clínica Cirúrgica da Escola de Medicina e Cirurgia da UNI-RIO. Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões.

 

RESUMO – O autor realizou um estudo etiopatogênico das lesões traumáticas em geral, com base em sua experiência de mais de 35 anos em serviços de emergência do Hospital Souza Aguiar (antigo Pronto-Socorro) e do Hospital E. Getúlio Vargas. Em seguida, acoplou suas informações com uma pesquisa etiopatogênica, em que analisou 4.582 lesões traumáticas observadas em 13.489 pacientes atendidos no Serviço de Emergência do Hospital E. Getúlio Vargas, inferindo dados que julga importantes para os que pretendem estudar o trauma nos diferentes setores do corpo ou para aqueles que planejam organizar serviços de emergência. Finaliza o trabalho sistematizando uma nomenclatura correta para as lesões traumáticas.


CONCEITO E CONSIDERAÇÕES

Traumatismo é a designação genérica que abrange todas as lesões decorrentes da ação direta ou indireta de um agente vulnerante sobre o corpo humano. As lesões resultantes são, por sua vez, denominadas lesões traumáticas.

Embora o âmbito do termo – traumatismo – admita a inclusão dos traumas das cirurgias neste capítulo da patologia, o senso comum já consagrou sua aplicação exclusiva para as lesões de natureza acidental ou decorrentes de agressões. Este será, por conseguinte, o critério adotado no presente trabalho, ou seja, o estudo das lesões produzidas no corpo pela ação de agentes vulnerantes, que o atinja em acidentes ou em agressões.

A importância do estudo das lesões traumáticas cresce dia-a-dia. Cremos firmemente que a medicina do futuro ficará praticamente restrita ao atendimento de traumatizados, pois o progresso desenvolverá, cada vez mais, as novas técnicas de vacinação e de terapêutica das doenças infecciosas e metabólicas. O progresso propiciará, em breve, os meios para o domínio, ou mesmo, a cura do câncer. As lesões traumáticas, pelo contrário, tenderão sempre a aumentar, porque elas são trazidas pelo progresso. O desenvolvimento industrial, criando novas frentes no campo dos acidentes de trabalho; as guerras e guerrilhas;

o aumento da criminalidade e agressividade;  a construção de veículos cada vez mais velozes e a mecanização da lavoura (levando o trauma ao interior), estarão seguramente contribuindo para a crescente incidência deste tipo de lesão.

Estas previsões reforçam a importância do melhor conhecimento das lesões traumáticas em geral e a maneira de tratá-las corretamente, sugerindo, inclusive, a criação de hospitais de atendimento exclusivo e emergências. Este era, aliás, o sistema hospitalar vigente há 20 anos em nosso meio e que em uma hora foi substituído. Esse tipo de hospital representará, a nosso ver, a forma mais adequada de assistência médica à população do futuro.

O número crescente das lesões traumáticas exige, também, sua maior divulgação, principalmente de seus aspectos propedêutico e o terapêutico.  Essa divulgação deve ser dirigida, não só ao meio médico, mas também aos leigos, porque o atendimento de um traumatizado deve ser iniciado imediatamente após a ação do agente vulnerante e raramente um médico está presente e disponível na hora do trauma. É fato sabido e notório que a maioria das mortes, nas grandes lesões traumáticas ocorre no local do acidente ou agressão, por hemorragia externa ou asfixia obstrutiva e que, quando o paciente consegue chegar vivo ao hospital, ele multiplica suas chances de sobrevida. Por isso é que insistimos na importância de divulgação ampla de instruções a leigos, através de todos os meios de comunicação disponíveis, porque eles é que estarão presentes no exato momento de atuação do agente vulnerante, podendo realizar os cuidados imediatos ao traumatizado, mantendo-o vivo até o atendimento médico.

À guisa de reforço ao proposto, é importante lembrar que, de acordo com estimativas de Royster, no momento de um grande trauma, 20% dos circunstantes permanecem calmos e agem imediatamente; 60% ficam entorpecidos sob o impacto dramático, mas após 30 ou 60 segundos tornam a agir calmamente e somente 20% ficam inteiramente confusos, agitados, totalmente incapazes de socorrer as vítimas. O público deve, pois, ser educado para exercer a parte do dever que lhe cabe, principalmente no que tange aos dois principais problemas responsáveis por morte imediata (hemorragia externa e obstrução respiratória), porque 60% têm condições de agir rapidamente.

Ainda na linha de raciocínio de instruções a leigos, deve ser aqui lembrado o problema de prevenção de acidentes. Recomendações aos fabricantes de autos e máquinas em geral para desenhá-los, visando menos estética e mais a segurança; instituição de leis de tráfego mais severas; educação escolar mais apropriada; escalas de trabalho que evitem a fadiga etc. são medidas que devem ser constantemente enfatizadas, até sensibilizar os dirigentes deste país, para que o problema seja encarado com a devida seriedade.

 

ETIOLOGIA

À etiologia do traumatismo apreciada de um modo global compreende os tipos clássicos de trauma, ou seja, de ordem mecânica, física ou química. Os traumatismos mecânicos são os mais frequentes e mais importantes, por isso constituirão o objetivo primário do estudo etiopatológico que empreenderemos.

Os principais agentes vulnerantes responsáveis por traumas mecânicos são: agressões ou acidentes por projéteis de arma de fogo e por armas brancas; acidentes automobilísticos (atropelamentos ou colisões);

quedas da própria altura ou de níveis mais elevados; acidentes ou agressões com objetos pontiagudos cortantes ou rombos; acidentes ou agressões a socos e pontapés; acidentes de prática desportiva; acidentes domésticos; acidentes de motocicletas e bicicletas; mordeduras e picadas de animais; acidentes industriais etc. Menos frequentemente podem ser apontados os acidentes de via férrea; soterramentos; coices ou chifradas de animais; acidentes decorrentes de convulsões da natureza tufões, furacões, terremotos etc.

Uma análise sumária destes agentes vulnerantes evidencia alguns dados que julgamos relevante ao nosso estudo, tais como:

1)      Agressões ou acidentes por projéteis de arma de fogo: armas de fogo dos mais variados calibres, usadas em agressões ou disparadas acidentalmente, constituem os mais graves agentes etiológicos de traumas. O tórax e o abdome, por suas dimensões, são as partes do corpo mais frequentemente atingidas por eles.

2)      Agressões ou acidentes por arma branca, objetos ou lâminas, de forma e dimensões variadas, produzem feridas de extensão e profundidade diversas. O principal alvo das armas brancas é o abdome, situando-se o tórax logo a seguir. As mãos e o antebraço são também frequentemente atingidos no manuseio dessas armas e na defesa às agressões por elas.

3)      Acidentes automobilísticos,

4)      por colisão de veículos (em que os ocupantes do veículo são lesionados), ou por atropelamento (em que o paciente é colhido pelo veículo), também são frequentemente responsáveis por traumas graves em geral.

Nas colisões, o crânio e o tórax  são mais frequentemente lesados; nos atropelamentos, o crânio e os membros pagam maior tributo.

A incidência deste tipo de trauma vem aumentando muito ultimamente, a ponto de situar-se bem próxima à dos projéteis de arma de fogo ou da arma branca. Isto se deve ao aumento do número e da velocidade dos veículos.

5)      Quedas: as quedas da própria altura sobre objetos rombos, pontiagudos ou angulados (como degraus de escadas), habitualmente produzem lesões cranianas, torácicas e de membros. Nas quedas de pontos mais elevados as lesões são mais graves, comprometem principalmente o crânio, mas estão geralmente associadas a danos e outros setores do corpo.

6)      Agressões ou acidentes com objetos pontiagudos, cortantes ou rombos, que não se configuram como armas, também, frequentemente produzem traumas de tipo e gravidade variáveis. O pé é a região do corpo mais frequentemente lesada acidentalmente por esse tipo de agente vulnerante. O objeto está geralmente colocado sobre o solo e é então atingido pelo tornozelo ou pé do paciente. Objetos rombos, cortantes ou ponteagudos podem, também, quando utilizados como armas, produzir lesões nas demais regiões do corpo e de caráter mais grave do que as acidentais.

7)      A prática desportiva está sujeita à ocorrência de traumas por quedas, colisões entre os desportistas, colisão com apetrechos desportivos, pontapés, socos e acidentes diversos. Os membros e o

tórax são habitualmente os mais

atingidos por este tipo de

acidente.

8)      As agressões e socos ou pontapés, decorrentes de conflitos individuais ou de grupos, comumente provocam lesões traumáticas mais frequentemente na face e crânio.

9)      Os acidentes domésticos compreendem, em sua maioria, quedas e ferimentos com apetrechos e instrumentos de cozinha. De maneira geral, neste tipo de acidente os membros são mais frequentemente lesados.

10)  Nos acidentes de motocicletas ou bicicletas, o crânio e os membros são os mais atingidos. Pela maior velocidade e falta de proteção, são geralmente muito graves as lesões decorrentes de acidentes por motocicletas.

11)  As mordeduras ou picadas de animais (mamíferos, répteis, aves, insetos etc.) são relativamente frequentes em nosso meio. Com exceção das picadas de cobras venenosas, estas lesões são de gravidade média ou pequena.

Os membros inferiores são mais

frequentemente comprometidos

por estes agentes vulnerantes.

12)  Nos acidentes industriais, o membro superior paga o maior tributo, - seguido do crânio. – mas o tórax é também lesado com certa frequência.

13)  Os acidentes de trem podem resultar de colisões ou atropelamentos de pedestres que inadvertidamente atravessam a via férrea. Esses graves traumas são mais frequentemente observados em hospitais situados próximo a subúrbios servidos por via férrea.

Um outro tipo de acidente ferroviário, observado em nosso Estado com relativa frequência, é o que  vitima os “pingentes” que se penduram em viaturas lotadas.

14)  Os soterramentos habitualmente produzem lesões múltiplas. O crânio e o tórax estão geralmente comprometidos neste tipo de acidente que é de caráter grave, mas, felizmente, pouco frequente.

15)  O coice de animais habitualmente atinge o abdome de adultos e a face de crianças; todavia, com relativa frequência podem ser observadas lesões torácicas em decorrência desse tipo de agressão.

16)  As chifradas de animais geralmente atingem as regiões inguino-crurais ou o abdome interior de suas vítimas. Menos frequentemente o tórax e as partes distais dos membros são lesados.

17)  Os acidentes de avião e os decorrentes de convulsões da natureza são raros. As lesões que produzem são habitualmente múltiplas e mortais.

Além dos traumas mecânicos, o corpo pode ser atingido por agentes vulnerantes físicos e químicos. Os principais agentes vulnerantes físicos não-mecânicos são: o fogo (queimaduras externas do revestimento cutâneo e as internas do aparelho respiratório); a água (alongamentos e, água salgada ou doce com inundações alveolares), o calor (em sólidos, líquidos ou vapores); o frio duradouro (congeladuras), as explosões (o corpo é atingido por ondas de deslocamento de ar contra as paredes do tórax e do abdome); a eletricidade;

as radiações ionizantes etc.

Os principais agentes vulnerantes químicos que podem agredir o corpo humano são: ácidos e bases fortes (queimaduras químicas); gasolina; querosene; detergentes; produtos de limpeza; gases irritantes inalados, etc.

No que tange à natureza do trauma, se acidental ou decorrente de agressões, os agentes etiológicos são alinhados, pela ordem de frequência, da seguinte maneira:

Traumatismos acidentais:

1º - Acidentes domésticos (mecânicos e físicos)

2º - Acidentes automobilísticos (mecânicos e físicos)

3º - Acidentes industriais (mecânicos, físicos e químicos)

4º - Acidentes do campo, na área da lavoura e da pecuária

5º - Acidentes da prática desportiva

6º - Acidentes ferroviários

7º - Acidentes aéreos

8º - Acidentes decorrentes de convulsões da natureza (raios, tufões, furacões, inundações, terremotos etc.)

Traumatismos por agressões

1º - Agressões por animais (cães, gatos, equinos. Gado. Insetos, répteis etc.)

2º - Agressões por arma de fogo

3º - Agressões por arma branca

4º - Agressões por instrumentos rombos (cassetetes, caibros, tijolos, garrafas cheias etc.)

5º - Agressões a socos e pontapés.

 

PATOLOGIA

O estudo da patologia dos traumatismos deve ser procedido através da análise dos seus princípios tópicos que são:

A- classificação e características anatomopatológicas das lesões.

B- Mecanismos fisiopatológicos.

C- Órgãos ou estruturas atingidas.

D- Tipos de lesões.

E- Número de lesões.

F- Lesões associadas.

G- Problemas fisiopatológicos decorrentes do trauma.

 

A- Classificação e características anatomopatológicas:

A simples designação geral de traumatismos não qualifica as lesões decorrentes da ação de um agente vulnerante.

Há necessidade absoluta de classificá-las e caracteriza-las adequadamente.

Os traumatismos e, consequentemente, as lesões traumáticas em geral são classificadas em:

Contusões ou Ferimentos (ou feridas).

 

Contusões:

São lesões traumáticas em que não se observam soluções de continuidade da pele. Elas são produzidas por agentes vulnerantes rombos, movidos de força viva variável, incapaz de vencer a resistência e a elasticidade da pele, mas em condições de produzir lesões internas.

Na maioria das vezes, o agente contundente deixa marcas características de sua atuação no ponto do impacto, como: abrasões, escoriações, equimoses, hematomas e esmagamentos subcutâneos (do tecido adiposo, aponeurótico ou muscular). Menos frequentemente, entretanto, pode-se observar contusões de violência sem sinais correspondentes à intensidade do trauma. Isto ocorre porque a pele geralmente desliza sobre o plano ósteo-muscular subjacente.

Este fato, entretanto, não exclui a possibilidade de lesões internas graves, que podem ser observadas com ou sem lesões externas aparentes. Quando o crânio, o tórax ou o abdome são os atingidos pelo agente vulnerante, aumenta muito a probabilidade de produção das lesões internas, faça menor resistência dos órgãos contidos nas respectivas cavidades.

 

FERIMENTOS OU FERIDAS

São lesões traumáticas recentes em que se observa uma solução de continuidade do revestimento cutâneo.

A qualificação exata destas lesões é mais laboriosa e exige o esclarecimento de aspectos importantes inerentes às feridas em geral, como:

a – Características anatomopatológicas

b – Grau de comprometimento

anatômico

c – Grau de infecção presente

d – Existência de ferimento da saída do

agente vulnerante

e – Ocorrência de penetração (lesão de

uma cavidade serosa)

a) Quanto às características anatomopatológicas, as feridas podem ser divididas em: punctórias; incisas; contusas; por projéteis de arma de fogo, etc.

Feridas Punctórias: caracterizam-se pela presença de soluções de continuidade pequenas, puntiformes, circulares ou estreladas. Elas são produzidas por instrumentos ponteagudos, afilados, e de pequeno diâmetro. Esses instrumentos ou armas geralmente penetram profundamente em cavidades, podendo facilmente lesar órgãos internos. As dimensões e o pequeno sangramento destas feridas levam os internistas, muitas vezes, a subestimarem o dano subjacente , devendo por isso serem sempre alertados quanto a esta possibilidade. Geralmente, as feridas punctórias são produzidas por pregos, agulhas de crochê, agulhas de costura, ponta de tesouras, vergalhões afilados, dardos, espetos de pau ou de ferro, etc.

Feridas Incisas caracterizam-se pela existência de bordas regulares, uniformes, a pique e são geralmente produzidas por lâminas de dimensões variáveis. As lâminas comuns de facas e das armas brancas em geral produzem um tipo de ferida que não pode ser rigorosamente rotulada de incisa. Na verdade, somente o bisturi cirúrgico ou a navalha (quando aplicada de um só golpe) são capazes de produzi-las. Por isso é que, habitualmente, se designa como ferida incisa toda lesão produzida por agente vulnerante, deixando de lado o rigorismo de seu aspecto anatomopatológico. As feridas incisas são comumente produzidas por: armas brancas em geral ( facas, punhais, peixeiras, etc.), facas de cozinha, navalhas, giletes, fragmentos de vidro, bisturi, tesouras abertas, canivetes, etc.

Feridas Contusas caracterizam-se pela existência de bordos irregulares, anfractuosos, com atrição tecidual e presença de equimoses nos bordos da ferida e nas adjacências. Elas são geralmente produzidas por agentes vulnerantes rombos os mais variados, desde o pára-choque ou pára-lamas de automóveis até o cassetete de policiais. Na verdade existe uma gama enorme de objetos rombos capazes de produzir ferimentos contusos, desde que movidos de grande força viva.

Feridas por projéteis  de arma de fogo são, em sua maioria, do tipo perfuro-contusas. Elas não são, entretanto, designadas por seus caracteres anatomopatológicos devido a grande variedade de armas de fogo e aos diversos aspectos que tornam as lesões por eles produzidas. Os orifícios da entrada de projéteis diferem muitos dos orifícios de saída; diferem também as lesões produzidas por um mesmo tipo de projétil, se ele, antes de atingir o tórax colide com um objeto sólido e se deforma; diferem muito as lesões produzidas por projetéis da prática civil, das produzidas por arma de guerra, cuja força viva é habitualmente muito maior; diferem as pequenas lesões de projéteis de pequeno calibre das lesões extensas de fragmentos de granada etc. Nesta justificativa deve ser ainda levado em conta o fato de uma ferida perfuro-contusa poder ser também produzida por outros agentes vulnerantes, que não os projéteis de arma de fogo, trazendo confusões ás designações.

Por estes fatos é que na prática se convencionou designar estas lesões, conotando-as ao agente vulnerante. Assim sendo, são englobadas como feridas por projétil de arma de fogo, as feridas perfuro-contusas clássicas, as em sedenho, as canaladas, as feridas-contusas produzidas por projéteis ricocheteados, deformados, as grandes feridas com perda de substancia (dos artefatos de guerra), os orifícios de entrada e de saída de projéteis etc.

 

b) O grau de comprometimento anatômico de uma ferida, no que tange à extensão ou planos atingidos, depende muito do tipo do agente vulnerante. Quanto a este aspecto as feridas são classificadas em: simples; compostas.

Feridas Simples são aquelas em que somente a pele e o tecido adiposo subcutâneo são comprometidos.

Feridas Compostas ou complicadas são aqueles em que outros planos, tecidos ou órgãos subjacentes são também comprometidos, como aponeuroses, músculos, vísceras etc.

Uma referência especial às perdas de substância, que ocorrem em determinados ferimentos mais violentos, de vê ser inserida no grupo das feridas compostas.

 

c) O grau de infecção presente em uma ferida deve ser sempre cuidadosamente avaliado. Dependendo do grau da contaminação do agente vulnerante, da existência ou não de infecção prévia, do tempo transcorrido e do ambiente em que ocorreu o trauma, as feridas resultantes são subdividas em: limpas; contaminadas; infectadas; supuradas.

Feridas limpas são as produzidas por agentes vulnerantes não contaminados, em pele limpa e observadas pouco tempo após o trauma.

Feridas contaminadas são aquelas de tempo transcorrido inferior a 6 ou 8 horas e que, embora contenham germes (levados pelo agente vulnerante ou por contato posterior com outros contaminantes) estes não apresentam ainda número e virulência ameaçadores.

Feridas infectadas são aquelas cujos germes, pelo tempo transcorrido, já apresentam número e virulência grande, determinando o aparecimento de manifestações clássicas de infecção como calor, rubor, edema e dor local.

Feridas supuradas são aquelas em que já se observa o exudato local e manifestações gerais de infecção.

Além do número e virulência de germes, o grau de infecção de uma ferida é bastante influenciado pela presença de corpos estranhos na região. Os coágulos e resto de tecido necrótico também o influenciam por se comportarem como corpos estranhos ou meios de cultura de germes.

 

d) A presença de ferimentos ou orifícios de saída dos agentes vulnerantes é,  por si só, importante porque evidencia mais um dado relevante da classificação dos ferimentos que os subdivide em: cegos; transfixantes.

Ferida cega , como sabemos, é aquela que somente apresente o orifício de entrada do agente vulnerante. As feridas por arma branca são geralmente cegas, com permanência do projétil dentro do corpo.

Ferida transfixante é aquela em que o agente vulnerante atinge o corpo, produz um orifício de entrada, prossegue sua trajetória e sai, produzindo um orifício de saída na mesma região ou em regiões vizinhas. As feridas por arma branca raramente são transfixantes; mas os projéteis geralmente transfixam o corpo.

 

e) A existência ou não de comprometimento de serosas é imprescindível a uma correta qualificação de feridas. Essa informação subdivide as feridas em: penetrantes; não penetrantes.

Feridas penetrantes são aquelas em que o agente vulnerante atinge uma serosa, seja ela meninge, a pleura, o pericárdio, o peritônio ou a sinovial. A qualificação da penetração independe da profundidade ou extensão da lesão, mas sim da lesão ou não da serosa. As feridas penetrantes são muito frequentes no tórax, face e grande extensão e superficialidade da pleura.

Feridas não penetrantes são as que não atingem a serosa, embora possam, em certos casos, alcançar grande profundidade.

 

 

B) MECANISMOS FISIOPATOLÓGICOS

Informações relativas ao mecanismo de ação do agente vulnerante são também importantes à patologia dos traumas em geral .De uma maneira  geral, os agentes vulnerantes agem sobre o corpo movidos por sua própria força viva, mas atuam também quando, como objetos inertes e firmes, recebem o impacto do corpo projetado contra eles.

A grande maioria das lesões produzidas resulta da ação diante do agente vulnerante sobre o mesmo segmento do corpo. Todavia, elas podem ser produzidas quando o agente vulnerante atinge levemente regiões vizinhas e secundariamente se encaminha para as regiões mais comprometidas. É também possível a produção de uma lesão indireta, quando o agente vulnerante mobiliza , anormalmente, peças ósseas fraturadas e estas provocam lesão interna. Mais raramente, poder-se-á ter uma lesão indireta de uma região sem que o agente vulnerante chegue a atingi-la, como acontece em determinadas contusões abdominais de extrema violência, em que o diafragma ou órgãos sub-diafragmáticos, violentamente projetados contra o tórax, se transformam em agentes agressores.

 

C) ÓRGÃOS OU ESTRUTURAS LESADAS

Quanto aos órgãos ou estruturas atingidos, verifica-se que, ao produzir-se uma contusão ou ferimento, as lesões resultantes podem ficar restritas às estruturas superficiais ou se estenderem aos órgãos contidos no interior de cavidades ou na profundidade de membros. Podem, pois, ocorrer lesões superficiais e lesões internas.

As principais estruturas atingidas nas lesões superficiais são: pele, tecido adiposo subcutâneo, aponeuroses, músculos; ossos, vasos e nervos superficiais. A incidência de lesões superficiais é bem maior que a de lesões internas. Os órgãos ou estruturas internas mais frequentemente atingidos em traumas são: músculos, ossos, pulmões, pleuras, coração. Vasos de base, esôfago, vísceras ocas e maciças do abdome etc.

 

D) TIPOS DE LESÕES

As lesões superficiais e as internas, produzidas pelos agentes vulnerantes, podem ser de tipos os mais variados, desde pequenos orifícios de instrumentos pontiagudos ou de projéteis de pequeno calibre, até os ferimentos e lacerações de dimensões variáveis ou as feridas com grandes perdas de substância. Podem ainda variar desde pequenas contusões, com simples equimoses parietais, às grandes contusões com traumas, lacerações, rupturas ou explosões de órgãos internos.

Uma referência particular às chamadas lesões traumáticas especiais deve ser neste tópico inserida, porque elas não se enquadram bem na classificação geral de contusões e feridas.

As principais são:

Grandes escoriações - provocadas por violenta atrição da pele, em arrastamentos no solo por tração ou quando o corpo é projetado contra o chão com grande força viva. A lesão profunda da derme, sem constituir uma verdadeira solução de continuidade, não podendo, portanto, ser enquadrada como ferida e nem como lesão acessório de uma contusão.

Esmagamento- provocados por violentas compressões da região atingida contra superfícies sólidas e firmes. Nesse tipo de lesão não ocorre, habitualmente, solução de continuidade da pele, mas os tecidos contidos em seu interior são dilacerados e totalmente destruídos.

Arrancamentos- provocados geralmente por agentes contundentes estáticos colhidos por membros ou segmentos do corpo movidos de grande força viva. Essas lesões podem também ser produzidas por grandes lâminas aguçadas ou machados, manejados por agressores bem fortes.

Os arrancamentos são lesões em que se observa a avulsão traumática de um membro ou parte dele, permanecendo no corpo da vítima somente a superfície cruenta irregular, semelhante a uma ferida contusa com perda de substancia.

Escalpes – São provocados por laminas ou objetos contundentes que colhem tangencialmente o couro cabeludo, ou por máquinas industriais (correias rotativas e prensas móveis), que colhem os cabelos do paciente arrancando o couro cabeludo. No escalpe o couro é descolado, com todos seus componentes (pele, tecido adiposo subcutâneo,vasos,nervos e camada muscular – aponeurótica) exatamente no plano supraperióstico de Merkel, deixando o perióstio á mostra.

 

E) NÚMERO DE LESÕES-

Outro aspecto importante da qualificação de um trauma é o do seu número. A informação referente ao número e características das lesões produzidas deve ser correlacionada com os dados anamnésicos. As lesões devem corresponder ao número de vezes em que, segundo informações colhidas, o agente vulnerante atingiu o corpo.

Isto permite, de imediato, a evidênciação do número real de lesões, principalmente no que tange a ferimentos ou orifícios de entrada e saída de projéteis. A identificação de orifícios de saída exige, além do conhecimento de suas clássicas características próprias, uma perfeita correlação dos dados numéricos colhidos na anamnese, pois nem sempre é fácil a distinção anatomopatológica.

 

F) LESÕES ASSOCIADAS –

A existência ou não de lesões associadas na mesma região traumatizada ou em diferentes setores do corpo, como o crânio, coluna vertebral, tórax, abdome e membros, constitui aspecto patológico da maior relevância propedêutica e terapêutica.

A investigação desta possibilidade deve sempre ser rigorosa, pois, ao produzir-se um trauma uma região pode ser atingida isoladamente (leões isoladas) ou ser comprometida juntamente com outros segmentos do corpo (lesões associadas ou múltiplas). Isto pode acontecer por ação simultânea de dois ou mais agentes vulnerantes, ou por um só agente ao prosseguir em sua trajetória.

Segundo nossas observações, cerca de 1/8 dos pacientes traumatizados têm lesões associadas de um ou mais setores do corpo e seu prognóstico, obviamente, é agravado por estas associações.

 

G) PROBLEMAS FISIOPATOLÓGICOS –

Em resposta á um trauma qualquer o organismo reage por via neuro-endócrina, mobilizando uma série de hormônios para fazer frente á agressão. Essa mobilização é, na maioria das vezes, exagerada, porque a natureza não provê o organismo de condições para quantificar os hormônios liberados em relação á gravidade e intensidade do trauma. Pelo menos nas fases iniciais, o traumatizado reage energicamente, liberando maciçamente – catecolaminas, vasopressina, aldosterona etc.

Em consequência disto, uma série de alterações se desenvolvem, á saber: alterações na distribuição de água e eletrólitos; alterações bioquímicas e metabólicas; alterações do ph sanguíneo e até no ph da intimidade dos tecidos. Estes problemas fisiopatológicos são geralmente observados nas fases iniciais do trauma, mas podem se apresentar em qualquer etapa na evolução, mormente nos grandes traumas ou naqueles que sofrem complicações.

Além destes problemas, os traumatizados estão sujeitos a outros eventos fisiopatológicos graves que constantemente ameaçam sua integridade, tais como: hemorragia, choque, infecção e insuficiência ventilatória.

INCIDÊNCIA –

A fim de obter uma amostragem de incidência das lesões traumáticas em geral em nosso meio, realizamos pesquisa clínica, examinando 13.489 atendimentos médicos sucessivos ocorridos no Serviço de emergência do Hospital estadual Getúlio Vargas durante 4 semanas. Os dados por nós obtidos, de uma maneira geral, coincidem com estatísticas nacionais e estrangeiras existentes, porém algumas peculiaridades, próprias da zona em que está localizado o Hospital, foram observadas e serão devidamente analisadas. A incidência das lesões traumáticas em relação aos atendimentos médicos em geral foi de 33,96% (4.582 3m 13.489).

Conforme se pode depreender, 1/3 dos atendimentos médicos de emergência do Hospital resultam de lesões traumáticas e, segundo previsões lógicas, esse número tende sempre a aumentar com

o desenvolvimento do país.

Para maior fidelidade das informações tivemos o cuidado de distinguir as lesões traumáticas isoladas das lesões múltiplas ou associadas, mostrando separadamente as respectivas incidências, nos diferentes itens da pesquisa. Do total de 4.582 lesões traumáticas estudadas 4.019 (87,71%) eram de lesões isoladas (em que só uma região é atingida) e 563 (12,28%) eram de lesões múltiplas.

A incidência em relação á idade, sexo, cor e profissão das vítimas mostra maior frequência de lesões traumáticas nas crianças e jovens, devido, a nosso ver, não só a maior população nesta faixa etária, mas também á inexperiência e maior exposição aos agentes vulnerantes. Pelas mesmas razões, o número vai decrescendo nas décadas maiores.

Em relação ao sexo, cremos que os números evidenciam a maior exposição do homem ao trauma, face ás contingências naturais, profissionais, práticas desportivas e o desenvolvimento de atitudes mais enérgicas e menos prudentes que as mulheres.

Lesões traumáticas - sexo masculino:2.899(63,26%);

sexo feminino:1.683(36,73%).

Em relação á cor, acreditamos que os números reflitam a proporção que normalmente existe entre os habitantes da região atendida pelo Hospital Estadual Getúlio Vargas (subúrbio da Penha,RJ).

Lesões traumáticas – cor branca:2.748 (59,97%); cor negra: 882 (19,24%):

cor parda: 952 (20,77%).

A pesquisa quanto á profissão dos  traumatizados foi simplificada, de vez que seria impossível enumera-las. Dividimos os pacientes em intelectuais (estudantes, profissionais liberais, militares, administrativos e trabalhadores não braçais em geral), braçais (trabalhadores braçais, escolarizados ou não) e não indicada (crianças até 10 anos, profissões não classificadas como intelectuais ou braçais e as não indicadas na papeleta de admissão.

Cremos que o fator instrução tenha influenciado decisivamente na menor incidência de lesões traumáticas observada nos intelectuais, seguramente mais cautelosos e com noções de prevenção.

Lesões traumáticas:

Intelectual 947 (20,66%);

Braçais 1,679(36,64%);

Não indicadas 1,956 (42,68%).

O local em que o paciente se encontrava por ocasião do trauma foi também por nós pesquisado. Lamentavelmente na grande maioria dos boletins de atendimento consultados, este dado não foi assinalado. Nossa intenção era a de averiguar a veracidade das assertivas de que os acidentes domésticos são os mais frequentes responsáveis por traumas. Nós também assim pensamos. Os acidentes ou agressões em via pública tiveram sempre o local de ocorrência bem anotados, face a necessidade de saída da ambulância para o atendimento e ao fato de a fiscalização ser mais severa quando os acontecimentos são em via pública, porque são de esfera policial. Mostramos os seguintes resultados:

Lesões traumáticas: Via publica 609 (13,29%); Residência 188 (4,10%); Industria/comercio 85 (1,85%); Campo/terreno 56 (1,22%);

Via férrea 3 (0,065);

Não assinalado 3.641 (79,46%).

Os dados mais relevantes da pesquisa que realizamos são, a nosso ver, os relativos aos agentes vulnerantes, tipos de lesões e regiões atingidas, que analisaremos a seguir.

Agentes Vulnerantes:

Projéteis de arma de fogo: (79);

Armas brancas (42);

Acidentes automobilísticos (529);

Quedas (1.264);

Objetos ponteagudos cortantes ou rombos (135);

Prática desportiva (41);

Agressões a socos e pontapés (85);

Acidentes de motocicletas e

bicicletas (63);

Mordeduras ou picadas de animais (691);

Acidentes industriais (84);

Coices ou chifradas de animais (19);

Torsão (13);

Acidentes de trem (3);

Queimaduras por fogo ou calor (98);

Queimadura químicas (31);

Outros (27);

Não assinalados (154);

Total: 4.582.

 

A incidência quanto á etiologia nos mostra a participação dos diferentes agentes vulnerantes, distribuídos pela ordem que surgem enumerados no texto relativo á etiologia.

Quanto ao tipo ou características anatomopatológicos das lesões nossa pesquisa mostra, a priori, o elevado número de ferimentos contusos.

As razões principais deste fato foram assinaladas quando abordamos o elevado índice de agentes vulnerantes rombos encontrados no solo, lesando pés descalços em “topadas”, pisadelas etc. Também os desastres automobilísticos, acidentes industriais, mordeduras, quedas etc. produzem comumente feridas contusas.

 

Tipo de Lesão:

Contusões:1.869;

Feridas:– punctórias(485);

Incisas (207);contusas (2.105);

Por arma de fogo (79).

Total:2.876

Esmagamentos (8);

Arrancamentos (8);

Queimaduras (129);

Outros (95);

Não assinalados (21).

O numero total de lesões ultrapassa o de pacientes atendidos, devido á ocorrência de lesões múltiplas ou associadas, onde se verificam que 563 doentes tiveram duas ou mais lesões, chegando a 970. a incidência real teve, pois, que ser apurada em relação a 5.005 lesões.

As informações mais importantes de nossa pesquisa são pertinentes ao item região atingida. Elas servem de base para uma série de ilações e conclusões bastante úteis. Uma das mais importantes é a que sugere a melhor lotação médica de uma equipe de socorro de emergência por especialistas.

 

Região atingida:

Cabeça (1.350) - crânio (721),

face (629);

Pescoço (44); Tórax (231); Abdome e Pelve (107);

Membro superior (1.516) –

Ombro (111), Braço (202),

Antebraço (404), Mão (799);

Membro inferior – Bacia (2.064),

Coxa (451), Perna (468),Pé (1.063);

Órgão genitais (14),

Não assinalados (34),

Total geral: 5.360.

O elevado número de lesões cranianas (721 casos em 28 dias) indica a necessidade absoluta de uma boa lotação com neurocirurgiões.

Da mesma maneira o grande número de fraturas (210) e entorses (107) sugere a presença de traumato-ortopedistas.

O cirurgião plástico também deve compor as equipes de emergência, pois 629 lesões atingiram a face, que sempre requer uma recomposição mais estética.

Outra informação, por nós colhida, prende-se á diferença que observamos em relação á região mais frequentemente comprometida em trauma. As principais estatísticas apontam a mão como a parte do corpo mais frequentemente lesada, mas isto não foi por nós observado. O pé (1.063 lesões), isoladamente (990 lesões), ou em lesão associada (73 lesões) foi a região mais atingida em nossos pacientes. Seguiram-se, pela ordem, a mão (799), o crânio (721) e a face (629). Esta inversão de incidência em relação á mão é facilmente explicada pelo uso frequente de pés descalços pelos jovens pacientes da zona suburbana pobre atendida por este Hospital.

NOMENCLATURA DAS LESÕES TRAUMÁTICAS –

A nomenclatura das lesões traumáticas mostra-se algo imperfeita em nosso meio. Frequentes erros, designações impróprias ou incompletas, são frequentemente observadas em

boletins de atendimento e mesmo em informações médicas para fins policiais e jurídicos. Por isso, à guisa de complemento do estudo que realizamos, procuraremos relembrar e sistematizar a maneira correta de designar as lesões traumáticas em geral. Ao se designar uma lesão traumática, o primeiro cuidado que se deve ter é informar se a mesma é uma contusão ou uma ferida

( ou ferimento). Esse cuidado se prende ao fato de que estudantes e colegas menos experientes costumam designar equivocadamente as contusões como “traumatismo”, julgando serem sinônimos,  esquecidos de que traumatismo é a designação genérica da ação de um agente vulnerante sobre o corpo e que abrange não só as contusões mas também as feridas.

Quando a lesão é uma contusão, deve ser logo assinalada a região e o lado atingido pelo agente vulnerante. Em seguida, anota-se as lesões internas produzidas, se estas ocorreram e logo que identificadas. O agente vulnerante (agente etiológico) deve ser assinalado no fim da frase, precedido pelas palavras “provocado por”...ou ”produzido por”... ou mesmo ”agente vulnerante” tal. Para não tornar a frase muito longa, pode-se usar nova frase para designar o agente vulnerante.

Exemplo 1 – Paciente atropelado por auto é atingido no tórax, no lado direito, produzindo-se lesão sem solução de continuidade da pele, mas com fratura do arco médio da 5ª, 6ª e 7ª costelas e pequeno pneumotórax.

Nomenclatura correta-Contusão do hemitórax direito com fratura da 5ª, 6ª e 7ª costelas (arco médio, sem desvio dos fragmentos) e pneumotórax, por atropelamento (ou produzida por atropelamento).

Exemplo 2 – Paciente sofre queda em escadaria batendo com o hipocôndrio D contra o degrau, sofrendo uma ruptura do fígado.

Nomenclatura correta: contusão abdominal no hipocôndrio D com ruptura do fígado e hemiperitônio,

por queda de escada (altura x metros).

 

Exemplo 3 – Paciente agredido a barra de ferro apresenta-se inconsciente e hemiplégico á E, sem lesão externa alguma, mas seu exame radiológico mostra fratura do parietal direito com afundamento.

Nomenclatura correta: contusão craniana, fratura do parietal D, com afundamento e lesão encefálica por agressão á barra de ferro.

A nomenclatura correta será completada quando, após cirurgia ou exploração da ferida, ficar evidenciado o tipo de lesão

Encefálica (concussão, comoção, ferida, laceração, perda de substancia ou contusão com edema cerebral).

Este tipo de lesão é erroneamente designada simplesmente com “traumatismo cranio-encefálico por barra de ferro”, sem especificar se foi contusão ou ferida, se houve fratura ou não e qual o tipo da lesão encefálica.

Ainda a propósito da designação correta das contusões, é necessário chamar atenção para um fato, observado com colegas que seguem incondicionalmente normas ditadas pela literatura médica americana, que empregam inadequadamente a denominação “traumatismo fechado”,  ao invés da correta, contusão, para as lesões traumáticas sem solução de continuidade da pele, localizadas no tórax ou no abdome. Por que dizer que um paciente sofreu um “traumatismo fechado do abdome”, quando é mais simples e correto dizer que ele teve uma contusão abdominal? O paciente poderia ser confundido com outro que tenha tido um ferimento e que o mesmo tenha sido “fechado” por uma sutura, ou ainda, no caso de ferimentos penetrantes oblíquos do tórax, a ferida pode permanecer “fechada” por uma justaposição de tecidos da parede!.

Quando a lesão é uma ferida, o primeiro cuidado deve ser o de qualificar o tipo de ferida, se punctória, incisa, contusão ou por projétil de arma de fogo, para então ser assinalada a região (ões) e o lado atingido pelo agente vulnerante. Em seguida deve ser informado se a ferida é penetrante ou não penetrante e, na primeira hipótese, anotar também as lesões internas produzidas, logo que estas forem identificadas. O agente vulnerante deve ser assinalado no fim da frase ou, para não torna-la muito longa, em nova frase, precedida das palavras provocada por...ou produzida por...ou simplesmente agente vulnerante tal ou qual.

Se a lesão é produzida por projétil de arma de fogo, ao se qualificar o tipo de ferida deve-se informar logo se a mesma é cega ou transfixante. Quando

A ferida é transfixante deve-se ainda assinalar a localização do orifício de saída do projétil, além do orifício de entrada.

Exemplo 1 – Paciente sofre queda sobre uma tesoura aberta que produz um pequeno ferimento no precórdio, mas lesa o coração. Poucos momentos após o acidente o enfermo entra em choque com veias jugulares túrgidas e demais sinais de hemipericárdio, com tamponamento cardíaco.

Nomenclatura correta: ferida punctória de tórax na zona precordial, penetrante, com lesão cardíaca e hemopericardio com tamponamento cardíaco, por queda sobre tesoura.

Exemplo 2- Paciente agredido a faca na região hipogástrica, sofrendo duas feridas de jejuno.

Nomenclatura correta: ferida incisa penetrante de abdome (hipogástrio) com lesões (2) de jejuno, produzidas por agressão á faca. Antes de ser evidenciada a penetração ou as lesões de jejuno, a nomenclatura fica restrita a ferida incisa de abdome na região hipogástrica, por agressão a faca.

Exemplo 3 – Paciente atropelado em via pública é atirado ao solo e sofre extensa ferida no couro cabeludo que permite visualisar fratura com exposição de massa encefálica e perda de substancia.

Nomenclatura correta: ferida contusa da região occipito-frontal com fratura exposta do frontal (lado direito) e lesão encefálica com perda de substancia. Agente vulnerante: atropelamento por auto.

Exemplo 4 – Paciente agredido por projétil de arma de fogo sendo atingido na região temporal esquerda, localizando-se o projétil pela palpação sob o couro cabeludo da região occipital á direita. Radiológicamente nota-se fratura do temporal e do occipital.

Nomenclatura correta: ferida cega por projétil de arma de fogo na região temporal esquerda com fraturas de temporal esquerdo e dooccipital. Agente vulnerante: agressão por arma de fogo (projétil calibre...).

Exemplo 5- Paciente agredido por arma de fogo sendo atingido por 2 projéteis – um na região mamária esquerda e outro no epigástrio. O primeiro transfixou o tórax saindo na região escapular esquerda, mas o segundo foi localizado na loja renal direita. O paciente apresentou hematúria, sinais de irritação peritoneal, dispnéia e dor no hemitórax esquerdo. O exame radiológico revelou níveis hidroaéreos á esquerda e fratura do arco posterior da 6ª costela. Nomenclatura correta: feridas (2) por projétil de arma de fogo; 1[ ferida – transfixante penetrante de tórax com orifício de entrada na região mamária esquerda (linha mamilar 5º espaço intercostal e orifício de saída na região escapular esquerda (linha escapular interna, 6ª costela), com fratura do arco posterior da 6ª costela e hemopneumotórax esquerdo; 2ª ferida – cega penetrante de abdome com orifício de entrada na região epigástrica e lesões de ... (de acordo com os achados operatórios), Agente etiológico: agressão por arma de fogo.

Exemplo 6 – Paciente atropelado é colhido na coxa direita, que é esmagada pelo para-choque, sendo atirado á distancia, atritando o tórax no asfalto, tendo o pé esquerdo arrancado e o couro cabeludo totalmente descolado. Nomenclatura correta: ferimentos múltiplos  por atropelamento: 1º esmagamento da xoxa direita; 2º grande escoriação do tórax/ 3º arrancamento traumático do é esquerdo e 4º escalpe occipito-frontal total.

Exemplo 7 – Paciente pisa sobre um prego no solo.

Nomenclatura correta: ferida punctória da região plantar, por prego.

Exemplo 8 – Paciente mordido por cão na perna direita.

Nomenclatura correta: ferida contusa na região tibial posterior direita, por mordedura de cão.

Exemplo 9 – Paciente sofre atentado á bala quando saudava o povo com o braço esquerdo elevado. O projétil atinge o hemitórax esquerdo, ao nível do 5º espaço intercostal, na linha axilar posterior e permanece no tórax. Pouco depois, o enfermo acusa dor torácica esquerda e escarros hemoptóicos abudantes. O exame radiológico mostra hemitórax de volume médio e localiza o projétil em pleno parênquima pulmonar.

Nomenclatura correta: ferida cega por projétil de arma de fogo penetrante do hemitórax esquerdo (5] espaço intercostal/linha axilar posterior), com hemitórax (vol. aprox. de...) e lesão pulmonar. Agente vulnerante: agressão por arma de fogo.

Exemplo 10 – Paciente sofre atentado a bala (2 projéteis) ao saudar fiéis, de pé em carro aberto. O primeiro projétil transfixou o ombro direito do paciente. O segundo lesa seu dedo mínimo, atinge o epigástrio, transfixa o corpo e sai pela região lombar, produzindo múltiplas lesões de delgado e laceração do cólon.

Nomenclatura correta: feridas (2) por projétil de arma de fogo: - 1ª ferida transfixante de ombro direito, não penetrante, orifício de entrada na região deltoideana e orifício de saída na região escapular direita; 2ª - ferida transfixante de abdome, orifício de entrada no epigástrio e orifício de saída na região lombar esquerda, com perfurações múltiplas de jejuno-ilio e laceração de cólon transverso. Agente vulnerante: agressão por arma de fogo.

 

Bibliografia:

Freire,Evandro Trauma: a doença do século.

Whiting&Zernicke Biomecânica da lesão musculoesqueletica.

Bogossian,Levão Traumatismos em geral. Revista JBM, vol.41,Nº2,1991.

 

Obs:

- Todo crédito e responsabilidade do conteúdo é de seu autor.

- Publicado em Novembro/2022

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